“Vou te encontrar vestida de cetim/Pois em qualquer lugar esperas só
por mim/E no teu beijo provar o gosto estranho/Que eu quero e não desejo,mas
tenho que encontrar/Vem, mas demore a chegar/Eu te detesto e amo morte/Que talvez seja o segredo desta vida.”
Raul Seixas
Morte. Quantos
mistérios permeiam este inevitável acontecimento. Quantas pessoas ficam
confusas e temerosas ao pensarem que dela ninguém pode escapar. Para alguns, o
fim de tudo. Para outros, apenas o começo. Há também aqueles que a colocam nas
mãos do destino, relacionando-a a uma ordem cósmica, onde nada nem ninguém
podem alterá-la. “Morrer! Vira essa boca pra lá!”, dizem os mais medrosos.“Eu
não tenho medo da morte”, professam os corajosos. Passagem para o além?
Passagem pra lugar nenhum? Vai saber...
Segundo a
mitologia grega (outra vez flores?), Tanatos é a personificação da morte.
Inimigo do gênero humano, odioso mesmo aos deuses, Tanatos morava no Tártaro
(espécie de terceiro andar, de cima pra baixo, em relação à Terra) e teria coração
de ferro e entranhas de bronze. Os gregos representavam-no com o rosto desfeito
e emagrecido, coberto por um véu, os olhos fechados e com uma foice na mão. Em
Roma, Tanatos era chamado de Orco (daí a expressão “Orco Cane”), sendo provável
que encarnasse a divindade infernal que castigava os perjuros, ou até mesmo que
fosse uma primitiva divindade romana identificada mais tarde como Plutão. Era
uma espécie de anjo da morte que assassinava os moribundos, supondo-se que o
dia do seu aniversário, o quinto de cada mês, fosse infausto.
Ainda no campo
mitológico (volta o cão arrependido...), o Destino é uma divindade cega,
inexorável, filha da Noite (Nix) e do Caos. Os céus, a terra, o mar, os
infernos, tudo fazia parte do seu império. Destino era por si mesmo a
personificação da fatalidade, segundo a qual tudo acontecia no mundo. Todas as
outras divindades estavam submetidas ao seu poder. Nem mesmo Zeus, o mais
poderoso dos deuses, pôde aplacar Destino, nem a favor dos outros deuses, nem a
favor dos homens. O que Destino resolvia, era irrevogável.
Acredito que
muitos dos nossos temores em relação à morte podem ter relação muito próxima às
divindades citadas acima, especialmente ao Destino. Ainda hoje há quem acredite
que ele é que nos guia para tudo (lavar a louça, comer polenta, essas coisas...). Porém, se jogarmos
nossas fichas no Destino, penso que é uma má escolha (só uma opinião). Sendo
ele uma divindade cega, só mesmo nós, humanos ultra evoluídos, para confiar ao
Destino tudo que se passa por aqui. Colocar em um ser sem glóbulos oculares a
responsabilidade de decidir quando devemos atravessar o caminho da vida para a
morte é, no mínimo, desinteligência. Para aqueles que, ainda assim, mantém sua
fé e continuam sendo seus fiéis seguidores, recomendo canalizar uma parte de
suas orações a ele, Destino, pois Zeus já deixou bem claro que nos assuntos do “inexorável imperador”, ele não mete a colher.
E quanto a
Tanatos? Estamos preparados para sua chegada? Estamos prontos para o seu golpe
derradeiro? Eu diria que não estamos preparados nem para viver... Contudo, acho
que para a morte o preparo não é necessário. Essa é uma questão irrelevante.
Para os temerosos, deixo aqui minha receita para afastar este medo: morra sem
ter tempo para pensar no assunto. Exatamente o contrário do que estamos fazendo
agora. Quer trocar de assunto?
De consolo,
fiquemos com algumas palavras de Freud, dias antes de partir: “Talvez os deuses
sejam gentis conosco, tornando a vida mais desagradável à medida que envelhecemos.
Por fim, a morte nos parece menos intolerável do que os fardos que carregamos
em vida.” Nada mal.